Ketlen Wiggers, atacante das Sereias da Vila (Crédito: Divulgação)

Toda vez que eu passo em frente ao CT Rei Pelé e vejo meu rosto no muro, passa um filme na minha cabeça. Aquela menininha da cidade Rio Fortuna, interior de Santa Catarina, hoje está na história do Santos.

O futebol veio de sangue. Minha família sempre gostou e jogou futebol, tanto meus pais como meus irmãos. Sempre foi muito tradicional na minha cidade, principalmente o feminino. Então, desde criança eu jogava e gostava. Com 8 anos eu entrei em uma escolinha, fui convidada pelo professor, e comecei disputar campeonatos pela escola.

Quando cheguei aos meus 14 anos, eu descobri que teria uma peneira no Santos. Eu sempre quis estar em um grande clube. Eu fiz a peneira e passei de primeira. E foi quando começou engrenar minha vida profissional e a realização de um sonho, que era jogar futebol.

Ketlen chegou cedo para categorias de base do Santos (Crédito: Reprodução)

O filme, na verdade, é bem longo. Eu vim sozinha para Santos. Não consegui trazer todos para cá. Logo que cheguei, minha mãe me acompanhou na peneira e principalmente no primeiro ano. Eu tive um acompanhamento familiar, sempre me ajudaram nessa parte. Só que foi muito difícil para mim. Eu vim de uma cidadezinha muito pequeninha. Foi a primeira vez que eu saí e vim uma cidade grande como Santos. Foi bem difícil o começo, principalmente pela saudade de casa, ainda mais porque estava na adolescência, e estar com meus amigos e família sempre foi minha alegria. Então, foi um processo bem difícil.

Passou pela minha cabeça várias vezes desistir e voltar para casa. Eu sempre falava para minha mãe que iria voltar. Todos os dias ela me falava para aguentar mais uma semana, mais um mês, e o tempo foi passando. Passaram dois meses, três meses, um ano e aí eu consegui me adaptar.

Eu morava na casa do meu treinador, Kleiton Lima. Morava com ele e a família dele. Eles me ajudaram muito na adaptação ao clube e à cidade. Tudo era novo para mim. Eles acabaram se tornando uma família. Eu agradeço muito a eles.

A oportunidade que o Santos me deu mudou completamente minha vida. Eu era uma menina que só tinha sonhos. Queria jogar em um time grande, sonhava em jogar pela Seleção. E quando virou a chave da minha vida e pude estar no Santos, tudo mudou totalmente. Mudou minha rotina e fui percebendo que o meu sonho de me tornar jogadora de futebol profissional estava sendo realizado.

Ketlen, Kleiton Lima e a lateral Thamires, da Seleção Brasileira (Crédito: Reprodução)

Nos dias de hoje, como sempre fiz, tenho aproveitado ao máximo cada momento. Converso com as pessoas, com torcedores… É muito importante, porque tenho vivido isso ao extremo. Vejo tudo vivi lá atrás e chegar aqui sendo a maior artilheira é uma alegria.

Acho que realmente conquistei muita coisa aqui, até mais do que imaginava. Mas, hoje, colocar o futebol feminino para muitas meninas que querem realizar esse mesmo sonho, talvez seja meu próximo passo. Quero sim ser uma referência nisso, como pessoa e atleta.

O Santos sempre abriu portas para meninas da base e ajuda muito no processo de subir ao profissional. Muitas meninas passaram por isso e estão com a gente hoje. O Santos também abre portas para ex-atletas trabalharem no clube. Esse é o meu objetivo: quando pendurar as chuteiras, estar no clube, ajudar as meninas e colocar o futebol feminina lá em cima.

Ketlen foi homenageada com imagem no muro do CT (Crédito: Ivan Storti/Santos FC)

É sempre um processo. Eu já recebi muito menos do que recebo agora. Hoje, recebo um salário que dá para pensar no meu futuro. Claro que a gente quer trabalhar cada vez mais para ajudar nossa família, então, com certeza torcemos para o futebol feminino cresça cada vez mais, seja reconhecido no cenário e possa financeiramente ajudar bastante. O Santos tem uma parceria com a Faculdade Santa Cecília e é, inclusive, um dos únicos clubes que dão faculdade. Foi assim que eu consegui minha formação em Educação Física.

Hoje, eu não sou nada sem o Santos. Todos os lugares que eu vou me conhecem como a Ketlen, jogadora do Santos. Eu pretendo me aposentar aqui. Foi onde começou o meu sonho e é onde eu pretendo concluir.

Ketlen Wiggers, em depoimento ao DIÁRIO DO PEIXE