Juary fez parte da primeira geração dos Meninos da Vila, em 78 (Crédito: santos FC)

Por Fernando Ribeiro e Vinícius Cabral, especial para o DIÁRIO DO PEIXE

Que privilégio ter em nossa história camisas 9 que marcaram época.

Os pesquisadores Fernando Ribeiro e Vinícius Cabral, que escrevem os textos Jogos para sempre e Lendas da Vila para o DIÁRIO DO PEIXE, selecionaram aqui os cinco maiores centroavantes do Alvinegro Praiano. Juntos, esses jogadores fizeram 944 gols com a camisa do Santos. Alguns desses gols deram títulos inesquecíveis. Vamos relembrar um pouco a trajetória desses atletas pelo clube.

1 – Coutinho

Coutinho foi um dos maiores parceiros de Pelé (Crédito: Santos FC)

Nascido em Piracicaba, interior paulista, em 11 de junho de 1943, precisou de pouco tempo para tornar-se jogador de futebol. Talento precoce, Antônio Wilson Honório ainda hoje é o mais jovem jogador a atuar pela equipe profissional do Santos. Em 1958, então com 14 anos de idade, alinhou no time principal em Goiânia, na goleada por 7 a 1 diante do Sírio Libanês. Craque desde cedo, anotou um dos gols santistas na partida. Chegou à Vila Belmiro no já estrelado time santista que contava com o poderoso ataque PPP (Pagão, Pelé e Pepe).

Sem alarde e com muita determinação, aproveitou as poucas chances que teve e em menos de dois anos já era o titular absoluto da camisa 9. A técnica apurada e o fino trato com a bola, até hoje coloca-o entre os maiores centroavantes da história do futebol. Em tempos onde o 9 era alto ou forte, Coutinho não enquadrava-se em nenhum dos padrões. De tão inteligente, tornou-se o melhor parceiro de Pelé. Junto ao Rei, elevou as tabelinhas ao nível máximo, uma forma que encontraram para furar defesas rígidas e compostas por muitos homens.

A calma na frente do goleiro, era sua marca registrada: ao invés do chute forte para vencer os arqueiros, preferia a tranquilidade de tocar a bola levemente ao gol. Brincavam, inclusive, que seus gols não balançavam as redes, tamanha era a suavidade de seus chutes. Pelo Peixe, foram 368 gols marcados, em 457 partidas disputadas, número que o coloca como o terceiro maior goleador da história santista.

Não fossem seguidas lesões, teria sido o centroavante brasileiro titular na Copa do Mundo de 1962, no Chile. Foi campeão, porém não jogou nenhuma partida. Pelo Santos, ganhou absolutamente tudo: Paulista, Brasileiro, Libertadores, Mundial, todos eles mais de uma vez. Isso sem contar os inúmeros torneios amistosos em todo o planeta. Jogou também por Vitória, Portuguesa, Atlas (México), Bangu e Saad.

Autêntico, não tinha medo algum de expressar suas opiniões. Por julgar-se preterido por narradores esportivos, que confundiam-no com Pelé apenas nas jogadas ruins, passou a usar faixa em um dos pulsos. Era a forma de diferenciar-se e ganhar, críticas ou elogios, apenas pelos seus atos. Tornou-se folclórico depois de aposentado, com comentários ácidos sobre o time do Santos, porém quase sempre tinha razão em suas reclamações. Apaixonado pelo clube, esteve ao redor de Vila Belmiro até o seu falecimento, em 2019.

2 – Feitiço

Feitiço fez 215 gols pelo Santos (Crédito: Reprodução)

Feitiço é o maior artilheiro da história do Santos Futebol Clube. Sim, você não leu errado. Em média de gols por partida, Feitiço supera até mesmo o Rei Pelé. Marcou 215 gols, em 151 partidas disputadas, o que dá a incrível média de 1,42 (Pelé possui média de 0,97 gol/jogo). Em números absolutos, é o quinto maior artilheiro de nossa história. Goleador nato, foi artilheiro máximo do Paulistão em seis oportunidades, três delas pelo Santos (1929, 1930 e 1931). Era tão famoso na Baixada Santista que deu nome ao Feitiço Atlético Clube, que anos mais tarde se tornaria o São Vicente Atlético Clube.

Luís Macedo Matoso nasceu em São Paulo, em 29 de dezembro de 1901. O apelido surgiu de maneira espontânea, quando uma menina, empolgada pelo que via, disse “Luizinho parece um feitiço quando joga”. Desde então, o menino-craque tornou-se o Feitiço. Em 1923, começou sua vitoriosa carreira no São Bento, equipe paulistana que hoje não mais existe. O faro goleador foi fundamental na conquista do Campeonato Paulista de 1925.

O sucesso trouxe-o à Vila Belmiro dois anos depois, para fazer parte de uma das maiores linhas ofensivas da história do futebol brasileiro: o ataque dos 100 gols. Junto a Omar, Camarão, Araken e Evangelista, marcaram gols em profusão e apesar do vice-campeonato, ficaram eternizados na história do Paulistão. Ainda hoje, quase 100 anos depois, nenhuma equipe bateu a média de gols daquele Santos: 6,23 gols por partida.

Apesar da pouca habilidade, sabia marcar gols como poucos. Ficou famoso pelos chutes com o bico da chuteira. “Comecei a usar o bico da chuteira para me antecipar nas jogadas”, confidenciou certa vez.

Integrou por anos a Seleção Paulista, em tempos onde o Campeonato Brasileiro era disputado por seleções estaduais. Pela Seleção Brasileira, marcou quatro gols logo em sua estreia, no amistoso diante do clube escocês Motherwell, em 1928. Foi titular do Brasil na última partida antes da Copa do Mundo de 1930, porém não disputou o Mundial por desavenças entre paulistas e cariocas – nenhum jogador vinculado aos clubes paulistas foi convocado.

Deixou o Peixe em 1932, para juntar-se ao Corinthians. Depois, foi artilheiro e campeão uruguaio pelo Peñarol. Atuou, também, por Palestra Itália, Vasco e São Cristóvão, antes de pendurar as chuteiras.

3 – Pagão

Pagão é mais uma lenda da Vila Belmiro (Crédito: Santos FC)

Nascido em Santos, Paulo César de Araújo, o Pagão, é tido por Coutinho como o maior camisa 9 da história. E não é para menos. Desde muito jovem se destacava nas partidas realizadas na cidade e logo chamou a atenção do Jabaquara, onde fez as categorias de base. Depois foi para a Portuguesa Santista até chegar ao Santos no final de 1955.

Em novembro daquela temporada fez sua estreia com gol na vitória por 5 a 0 contra o Guarani, na Vila Belmiro, em partida válida pelo Paulistão. Pagão jogou algumas das últimas partidas do certame que marcou o fim da fila de 20 anos do Santos. Ágil e franzino, Pagão não era um típico camisa 9, mas sim primava pela habilidade e visão de jogo.

Fez um trio espetacular com Pelé e Pepe, chamado de Trio PPP. Com os companheiros ajudou o Santos a conquistar seis títulos paulistas, duas edições do Rio-São Paulo, duas Taça Brasil, além da Libertadores e do Mundial de 1962. Devido ao porte físico, as lesões foram recorrentes em sua carreira, mas quando estava em campo era garantia de bom futebol.

Com a ascensão de Coutinho a partir de 1959, Pagão acabou perdendo espaço, mas sempre que entrava correspondia. Chegaram a atuar algumas partidas juntos ao lado de Pelé e Pepe. Referência dos próprios companheiros, Pagão inspirou o compositor Chico Buarque, que na música “O futebol”, imaginava lances concatenados entre Pelé, Pagão, Didi, Garrincha e Canhoteiro.

Seu último dos 157 gols pelo Santos foi na vitória contra o Club Naval, do Chile, por 3 a 0. Na sequência o centroavante foi para o São Paulo e encerrou sua carreira no Jabaquara.

4 – Serginho

Chulapa liderou a equipe no título Paulista de 84 (Crédito: Reprodução)

“Aqui no Morumbi, a fé é que me move. Meu camisa nove treinou bem, vai jogar. Salvador da final, salve nosso Natal”. Os versos escritos pelo santista Mano Brown em regravação da música Umbarauma de Jorge Ben Jor resumem a fé que a torcida santista tinha em seu camisa 9.

E Serginho Chulapa salvou o Natal de 1984 de todos os santistas. Seu gol no jogo decisivo contra o Corinthians tirou o Santos de uma fila de seis anos sem títulos. Aquele centroavante alto, por vezes desengonçado, mas muito letal, era muito mais que um simples camisa 9. Serginho era transpiração, era um torcedor em campo, brigava com tudo e todos. Peitou o sistema.

Sérgio Bernardino nasceu em São Paulo, em 1953, e antes de chegar ao Peixe fez história no Morumbi. É o maior artilheiro da história do São Paulo e sua chegada ao Santos se deu quando já tinha 29 anos, pouco depois de sua participação na Copa de Mundo de 1982. Em sua primeira das quatro passagens como camisa 9 santista, Serginho ajudou o time a chegar ao vice-campeonato brasileiro de 1983 e ao título paulista de 1984. Foi artilheiro das duas competições.

A primeira das 104 vezes que balançou as redes pelo Peixe foi em dose tripla: 3 a 1 contra o Moto Club (MA) pelo Brasileirão de 1983. Em 1985 teve passagem apagada pelo Corinthians e logo retornou ao Santos. Foi para o Marítimo de Portugal e novamente voltou ao time que amava. Em 1988 foi para o Malatyaspor da Turquia e no ano seguinte regressou à Vila Belmiro.

Sua última partida pelo Santos foi contra o São Paulo, no fim de 1990. Jogou também por Portuguesa Santista e São Caetano. Após a aposentadoria como jogador voltou ao Santos várias vezes como auxiliar e técnico interno. Até hoje está na comissão técnica do time e pode ser visto facilmente pelas ruas da cidade de Santos.

5 – Juary

Juary era um dos destaques do time de 78, que também venceu o estadual (Crédito: Santos FC)

A história de Juary Jorge dos Santos Filho é semelhante à de vários meninos que tentam a sorte no futebol longe de casa. Nascido em São João do Meriti (RJ), foi levado pelo pai para fazer testes no Santos quando tinha 14 anos. Logo chamou a atenção de todos no clube e em 1977 era uma das esperanças de um clube endividado, um fato recorrente em nossa história.

O camisa 9 estreou ainda em 1976 em derrota para o Volta Redonda. Seu primeiro gol como profissional foi na vitória contra o XV de Jaú no ano seguinte. Mas foi no Paulistão de 1978 que Juary entrou para a história do Santos Futebol Clube. Ao lado de nomes como João Paulo, Ailton Lira, Pita e Nilton Batata, foi um dos destaques da campanha que terminou em título após uma verdadeira batalha contra o São Paulo.

Suas comemorações correndo em volta da bandeirinha de escanteio viraram uma marca registrada. Os Meninos da Vila encantaram o futebol paulista muito por conta daquele camisa 9, rápido, atrevido e com faro de gol. Foram 101 bolas na rede com a camisa do Santos. Em 1982 foi negociado com o Universidad Guadalajara, do México, por 13 milhões de Cruzeiros. Fez carreira no futebol italiano passando por Avelino, Inter de Milão, Ascoli e Cremonese. Fez história no Porto, de Portugal, quando saiu do banco para marcar o gol do título contra o Bayern de Munique na Taça dos Clubes Campeões Europeus (atual Liga dos Campeões).

Juary voltou ao Brasil para atuar na Portuguesa e passou novamente pelo Santos, em 1989, sem o brilho de outrora. Encerrou a carreira no Moto Club (MA). Atualmente trabalha nas categorias de base do Peixe, com um projeto de escolinha do clube na Itália.